quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

[Lembranças de Miyako Kinoshita...]

FLASH FORWARD: Julho de 2011.

Estávamos nos divertindo na festa de casamento do Ty com a Rory e, embora eu soubesse que aquela união tivesse começado de um acordo formal, apostaria tudo que tinha que os dois ainda se gostavam bastante. (Só precisavam deixar algumas mágoas do passado onde deveriam ter ficado e eles poderiam ser felizes juntos...)

Como não conseguia permanecer de pé por muito tempo (uma vez que já tinha entrado no meu último mês de gestação), me sentei à mesa com minha família e acompanhava Ty e Haley dançando não muito longe dali. Estava distraída os observando, enquanto bebericava alguns goles de suco de tomate gelado (o que tinha se demonstrado como meu principal “desejo de grávida”), quando senti uma dor forte contraindo os músculos da minha barriga e me fazendo gritar de dor e soltar o copo no chão.

Em poucos segundos todos da festa estavam aglomerados ao meu redor. Tia Louise dava instruções para Henri e para os outros curandeiros da casa, pois não daria tempo de chegarmos a um hospital e precisavam me locomover até um dos quartos; e mamãe agarrava minha mão com força, e parecia que também ia parir um filho, pois estava tensa e suando gelado – como eu. Estava na hora de eu conhecer o meu bebê.

***

Poucos minutos depois eu já me encontrava em uma cama macia, mas nem mesmo as orientações e incentivos que tia Louise, tia Mirian e Morgan me falavam, estavam conseguindo fazer com que eu me acalmasse e ignorasse a dor de cada contração. Nervosa, acabei expulsando Henri do quarto, aceitando do meu lado somente Ty e Gabriel. E cada um deles estava agarrado a uma de minhas mãos, e faziam força comigo.

Pareceu ter durado uma eternidade de dor até que finalmente um choro vivo preencheu o quarto e abafou todos os outros sons. E quando tia Louise me entregou um bebê com grandes olhos verdes vivos, enrolado em uma manta, e parecendo tão frágil e dependente de mim, eu entendi que nenhuma dor do mundo era realmente significante perto daquela sensação.

Depois que Gabriel e Ty saíram do quarto para comunicarem, Henri, meus irmãos, e todos os meus outros amigos e familiares entraram em seguida para conhecer Eicca. Mamãe e Sergei vieram juntos e, enquanto Sergei acomodava Eicca em seu colo, mamãe veio até mim e limpou meu rosto com uma toalha úmida. Seus olhos estavam molhados, mas ela tinha um sorriso fixo no rosto.

- Obrigada mãe. Por tudo. Eu entendo agora o que você disse... – eu dizia baixinho para ela, que ainda passava a toalha por minha testa com delicadeza e parecia incapaz de dizer alguma coisa.
- Do que você está falando?
- Anos atrás, quando eu disse que você não deveria se preocupar tanto com a minha vida... Você disse que “quando eu tivesse meus filhos, eu entenderia”. E entendo agora. Obrigada por ter se preocupado tanto comigo, sempre.

Ela parou para me olhar e não conseguiu se conter muito mais tempo, desabando em cima de mim e me apertando em um abraço.

- Eu te amo filha. E quer saber? Obrigada você por ter sido tão teimosa e me provado que mães também erram quando tentam proteger os filhos... Caso contrário, você não estaria me dando esse presente hoje. Ele é lindo. E eu sou vovó!

Ela exclamou com mais lágrimas escorrendo de seus olhos enquanto observávamos Sergei ninar Eicca em seu colo, cantando baixinho uma música russa. Eu tinha os melhores pais do mundo!

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FLASHBACK: Junho de 2000.

Junho passou como um raio por Durmstrang. Depois da temporária “trégua” dos ataques de vampiros, se deu uma verdadeira coleção de eventos importantes: a prisão do pai de Evie (bem como a “rendição” de Max), seguida da prisão de Luka; a viagem de formatura; a greve para expulsarmos o Ministério da Magia do controle do castelo; a incrível vitória da Sapientai no Torneio de Quadribol; os NIEM’s; a apresentação da nossa peça de teatro; a terceira e última tarefa do Torneio Tribruxo – que consagrou Biel como o campeão; e, finalmente, o evento mais esperado por todos nós do 7º ano: a formatura.

Enquanto acompanhava meus amigos, de um por um, subirem ao palco para pegarem seus diplomas, sentia como se milhares de borboletas estivessem voando em meu estômago. Durante os últimos meses eu havia ansiado por este dia: pelo momento em que eu finalmente pegasse meu diploma e me visse livre de todas as amarras invisíveis que me impediam de espalhar para todos que estava apaixonada por um professor; e que tínhamos planos para ficarmos juntos. Mas agora que ele finalmente era real, tentava lidar com todas as outras conseqüências que meu diploma acarretaria.

Não que ainda estivesse em dúvida sobre minha carreira; isso eu tinha definido há bastante tempo: seria jornalista, e já tinha garantido um estágio no Profeta Diário da França. O que realmente me assustava era a idéia de ter que me formar em Beauxbatons, lugar onde tinha sido realmente feliz e onde tinha de fato me encontrado e identificado, e não poder voltar para mais um ano letivo. Ter que “crescer” de verdade, que assumir responsabilidades, que enfrentar o mundo lá fora e não vacilar para correr atrás de todos meus objetivos. Tudo isso fazia com que minhas pernas tremessem embaixo da beca azul que estava vestindo.

- Kinoshita, Miyako.

Eu nem teria reagido se, ao meu redor, meus amigos não tivessem começado uma verdadeira zona de aplausos, gritos e assovios, e Griffon – da fileira de trás - não tivesse cutucado meu ombro para que eu levantasse.
Tentando controlar os pensamentos e o peso das pernas, subi ao palco e cumprimentei todos meus professores que ali estavam, inclusive Henri (que piscou para mim, abrindo um enorme sorriso no rosto que só consegui retribuir com um esboço torto da boca), parando no fim da fileira para receber o diploma de Madame Máxime.

E então eu vi mamãe e Sergei no meio de todos os outros familiares dos meus amigos, e cada um deles trazia no colo um de meus irmãos: os gêmeos Keiko e Hiro. E os breves instantes em que os vi, as expressões deles de orgulho estampado em euforia, fizeram com que eu deixasse todo o medo e incertezas de lado. Eles estavam comigo, me apoiando, e nada mais deveria importar.

***

A manhã seguinte à formatura representou um grande desânimo a todos nós, uma vez que era hora de arrumar as malas e partir. Porém, eu tinha planos diferentes, e consegui arrastar meus amigos comigo. Portanto, após virarmos a noite e vermos o sol nascendo em Durmstrang, nos apressamos a arrumar nossas coisas e partimos para Beauxbatons para um último e rápido adeus. (Não aceitaríamos ficar sem nos despedir de todos aqueles lugares que significaram tanto para nós...!)

Assim que chegamos, Seth e Griffon foram para o Salão Comunal da Lux enquanto Gabriel e Ty se encaminharam para o Salão Comunal da Sapientai. Sozinha, passei pelos corredores em direção ao Salão Comunal da Nox e entrei – pela última vez – no dormitório que dividi com Denise por tanto tempo.
Depois nos reencontramos e descemos todos juntos ao Salão Principal, e tomamos café por lá pela última vez.

- Temos que passar no lago e nos despedir das lindas sereias... – Ty falou sonhador sorrindo e os meninos concordaram. Revirei os olhos.
- Certo. Como não vou sentir saudade alguma de sereiano, vou descendo até o Campo de Quadribol e espero vocês lá.

Estava chegando ao campo quando cruzei com Jean Savoy no caminho. Ele vinha voltando de lá e estava muito sorridente.

- Oi Mi! O que faz aqui? Não deveria estar em Durmstrang?
- Oi Jean. É, deveríamos... Mas viemos nos despedir de Beauxbatons antes. Ty, Gabriel e os Chronos estão ali no lago se despedindo das sereias. – disse em tom sarcástico e ele riu. – E você? Está voltando do campo?
- Sim. Estava me despedindo do professor Henri antes de embarcarmos para as férias e... Ele disse que vai me indicar como o próximo capitão do time da Nox! Não é o máximo?!
- Henri está aqui? – perguntei rápido antes que pudesse pensar. – E, ah, parabéns Jean! Fico muito feliz por você. Tenho certeza de que vai ficar bem neste cargo.
- Obrigado! Está sim... Ele também chegou a pouco de Durmstrang, pois precisava organizar algumas coisas aqui.
- Ótimo. Então também vou lá me despedir dele. Boas férias Jean!

Eu quase comecei a correr quando os últimos metros para o campo de quadribol eram só o que me separavam de Henri. Durante a festa nós tínhamos sido discretos, pois, apesar de já estar formada, não queria que minha família soubesse de algo tão importante sendo contado de maneira tão leviana. Nós decidimos que conversaríamos com eles, juntos, assim que estivesse novamente em casa para as férias de verão.

Tiago estava sozinho no gramado consultando sua prancheta e corri até ele, tampando seus olhos com as mãos quando cheguei às suas costas. Ele riu.

- Eu não acredito. O que você está fazendo aqui? Já estava voltando para Durmstrang atrás de você, antes que embarcasse para casa... – ele puxou minhas mãos e se virou, me envolvendo pela cintura. – Meu amor.

Sorri e me levantei um pouco sobre as pontas dos pés para beijá-lo.

~*~

Não muito longe dali, no lago do castelo, Seth, Griffon, Gabriel e Ty, se ajoelhavam na sua beira para se despedirem da professora de sereiano, Mariska Sarkovy. Eles riam quando ouviram um barulho discreto ao lado e se viraram para se depararem com Yulli, que sorriu para eles e se aproximou.

- Oi meninos. Vieram se despedir do castelo com Miyako não é? Onde ela está?
- Ela foi descendo para o campo de quadribol antes de nós tia. O que está fazendo aqui? Cadê meu padrinho e os gêmeos? – Ty perguntou enrugando a testa.
- Ele já foi pra casa com os gêmeos. E Miyako não vai voltar com o trem de Durmstrang. Vim apanhá-la para termos um dia de garotas em Paris. Presente de formatura...
- Então vamos descer com você. Já estávamos a caminho mesmo! – Seth falou se levantando e batendo a capa. – Adeus professora. Até breve, eu espero. – Ele se despediu em sereiano e todos os garotos riram da cara de confusão que Yulli fez, seguida do sorriso de Mariska.
- Adeus meninos. – ela respondeu também em sereiano e sumiu na superfície do lago.

Estavam na metade do caminho quando cruzaram com Jean Savoy. Yulli continuou descendo o caminho sozinha enquanto eles paravam para conversar com o colega.

- Oi pessoal. Indo para o campo de quadribol também? Miyako está lá. Disse que ia se despedir do professor Henri...
- Henri está aqui??? – Gabriel perguntou de supetão, de repente parecendo em pânico, e trocou olhares tensos com os outros amigos.
- Sim. Também chegou de Durmstrang a pouco...

Eles até teriam corrido para impedir Yulli ou para avisar Miyako e Henri, e de fato eles tentaram, mas não conseguiram chegar a tempo. Pouco menos de um minuto depois, quando os quatro entraram correndo no campo, viram que a amiga estava no centro do campo abraçada ao professor, e eles se beijavam, ignorando completamente o fato de que a poucos metros deles Yulli observava a cena com uma expressão de total incredulidade. E raiva.

~*~

- O que está acontecendo aqui? – uma voz interrompeu meus devaneios e fui obrigada a abrir os olhos e me situar novamente. Um segundo depois, senti o estômago afundar ao ver que minha mãe caminhava na nossa direção parecendo furiosa. Tiago se congelou firme ao meu lado.
- Mãe! O que você está fazendo aqui?
- Eu perguntei primeiro, Miyako. O que vocês estavam fazendo? O que estava acontecendo aqui? – ela parou na nossa frente e tinha uma veia pulsando na testa. Olhava de mim para Tiago e sua boca tremia levemente.

Gabriel, Ty, Seth e Griffon caminharam cautelosos até nós e se postaram atrás da minha mãe com olhares diversificados como se falassem “desculpa”, “tenha calma” e “sejam cautelosos agora”. Respirei fundo antes de voltar a olhar pra minha mãe.

- Estava acontecendo um beijo, mãe. Como você deve ter visto... – respondi tentando ser firme e calma, e Gabriel fez um sinal positivo com a cabeça pra me incentivar.
- Eu vi Miyako. Não tente tranqüilizar as coisas. Eu quero entender O PORQUÊ de vocês estarem fazendo isso. O que aconteceu? Se excederam na despedida? Beberam demais na festa?
- O que aconteceu é que eu gosto da sua filha, Sra. Hakuna. E ela gosta de mim. E é só por isso que estávamos nos beijando. – Tiago respondeu do meu lado e vi Ty batendo na testa de relance.
- Vocês... Se gostam? HAHAHA! “Se gostam” desde quando? Eu posso saber? Se até ontem eu nunca tinha escutado minha filha falar de você!
- Isso é porque, até ontem, ele era meu técnico mãe! E professor da escola onde eu estudava! É “só” por isso que você não sabia de nada. Mas agora não há mais problema, há? Agora eu me formei e não tenho que dar satisfações. Nem Henri.
- “Não tem que dar satisfações”? – mamãe repetiu minha frase com um tom amargo e irônico na boca que começou a me magoar.
- Não estava falando de você... Mãe, nós nos gostamos e estamos juntos há alguns meses, escondidos. Íamos contar pra você e pro Sergei ainda essa semana, de melhor maneira. Por favor, não transforme isso em um problema maior do que é.
- Não vejo como eu posso piorar isso, Miyako. Francamente. Meses juntos! E às escondidas, como se fossem marginais! Não foi bem assim que imaginei que você gastava seu tempo de escola...
- Não me arrependo do que fiz. Estou feliz com ele, mãe. Não tivemos culpa se nos apaixonamos ok? Também não escolhi assim, mas aconteceu. O que você queria que eu fizesse?
- Que fosse um pouco mais madura pra aceitar que isso não tem a mínima chance de dar certo! Olhem pra vocês dois: são de idades muito diferentes; e objetivos também! São de mundos diferentes!
- Não acredito que sejamos tão diferentes assim... – Tiago falou antes de mim, que ainda lutava para digerir aquilo. – Nós REALMENTE nos gostamos e, durante todo esse tempo que estamos juntos “como marginais” também agüentamos muitas coisas juntos para que pudéssemos ter paz depois de tudo. Paz de espírito, principalmente. E por minha parte, não tenha dúvidas de que eu faria tudo de novo também.
- Vocês perderam a cabeça, mas agora é hora de voltar à realidade! Miyako vai começar um estágio longe daqui, e ainda tem tantas coisas para conhecer. Tantas pessoas!
- Vou fazer meu estágio aqui em Paris mamãe. – Já que o momento era das revelações, decidi que era melhor dizer tudo de uma vez.

A notícia caiu como uma bomba pra ela, que não conseguiu mais se mexer.

- Não quero trabalhar no jornal de Tóquio. Gosto daqui. Aprendi a viver aqui. E eu sei aparatar, não vai ser realmente um problema se tiver que ir pra casa todos os dias... – eu ia atropelando tudo, mas ela continuava estática.
- Eu não te reconheço mais. – foi só o que conseguiu dizer algum tempo depois e senti meu coração se apertar, pois ela tinha um olhar frio e duro.
- Mãe...
- Não. Você não é minha filha. Você mudou. Você era cheia de planos de conhecer todo o mundo antes de se “casar” com alguém e... Veja você agora! Escute o que está falando!
- Eu ainda quero isso, mãe. Não tem nada me impedindo...!
- ELE ESTÁ TE IMPEDINDO. ESSE ROMANCE TE IMPEDE! – Mamãe berrou levantando os braços e, automaticamente, Seth colocou uma de suas mãos no ombro dela como se pedisse calma. Ela se virou pra trás contra eles. – Vocês também sabiam de tudo! Vocês estão vendo Miyako enlouquecer e não fazem nada! É um complô?
- A única pessoa que está enlouquecendo aqui é você mãe! Eles não tem culpa de nada. Ninguém tem! Eu me apaixonei e é SÓ isso. Pare de encarar como se fosse o fim do mundo! – Pulei na frente dela também elevando a voz e ficando entre ela e meus amigos que pareciam muito chocados para reagirem.
- Ótimo! Vou parar de interferir na sua vida, agora que você não tem que me dar satisfações. Faça o que quiser com ela. Viva com quem quiser da maneira que achar mais sensata! Mas não volte pra casa! Pelo menos enquanto não voltar a ser um pouco racional! – ela gritou de volta e saiu marchando do campo.

Fiquei parada no mesmo lugar, encarando meus amigos e Tiago, que pareciam tão assustados quanto eu. Depois corri até ela, abordando-a quando já tinha atingindo os jardins.

- Você está me expulsando de casa? É isso? – perguntei com a voz falha e ela parecia segurar algumas lágrimas, pois seus olhos estavam inchados.
- Não. Você está escolhendo deixar ela e eu estou respeitando sua decisão. – ela respondeu seca desviando o olhar.
- Ok. Se você acha que essa é a melhor maneira de enfrentar tudo isso... Não vou mais discutir e nem pedir para que reconsidere. Você tem suas opiniões. Mas... Se quer saber o que eu penso de você agora, eu digo: agora eu entendo porque você e Sergei demoraram tanto para serem felizes, e porque você evitou ele por tantos anos. Você tem medo de se relacionar. Você é uma covarde e que tem medo de sofrer. Direito seu de auto-preservação, e eu aceito (apesar de não entender). Acho que finalmente estamos percebendo diferenças entre nós, “mãe”. E eu vou assumir os meus riscos, sozinha, se você prefere assim.

Sem conseguir dizer mais nada, voltei para o campo de quadribol aos prantos. Minha nova vida havia começado me puxando o tapete.

Who says I can’t be free?
From all of the things that I used to be
Rewrite my history
Who says I can’t be free?

Who Says – John Mayer

N.A.: Se lembrem desse dia como o dia em que eu finalmente formei a Miyako! Huahuahuahua!

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