O telefone tocou alto e Madeline descobriu parte do rosto, procurando o relógio. Já eram 9 horas da manhã. Ela esticou o braço para atender, mas um par de mãos a puxou de volta para a cama.
- Eu tenho que atender, Gabriel – Madeline disse rindo, enquanto ele a beijava.
- Deixa tocar, tenho certeza que não é uma emergência.
- É o toque da Marie, preciso atender – disse o beijando e conseguindo se soltar – Alô?
- Estava dormindo? – Marie falou do outro lado da linha, espantada.
- Não, já estava acordada – Mad respondeu tentando soar convincente – O que houve?
- Ele está ai, não é? – Marie riu – Desculpe atrapalhar, pode continuar o que estava fazendo.
- Marie, fala o que aconteceu – Mad desconversou e a amiga riu ainda mais – Você não me ligou a toa.
- Não é nada, esquece. Ian está em casa hoje e vai levar as crianças ao cinema. Avise ao Gabriel que devolvemos a Clara no fim da tarde, a tempo de embarcarem. E você pode tirar o dia de folga hoje.
- Dia de folga? Está louca! – agora era Mad que ria – Temos milhões de coisas pra resolver hoje, a exposição é amanhã!
- Não tem nada que eu não possa resolver sozinha. Faça bom proveito do dia. – Marie disse em um tom sacana e desligou o telefone antes que a amiga pudesse responder.
- Ela desligou na minha cara! – Mad olhou para Gabriel, indignada.
- Dia de folga? – Gabriel falou puxando Mad outra vez – Eu ouvi direito?
- Ela percebeu que você estava aqui, por isso veio com essa. Mas temos muitas coisas pra fazer hoje, não posso me dar ao luxo de ficar em casa.
- Se Marie disse que pode dar conta de tudo, você devia dar um voto de confiança a ela.
- Engraçadinho – ela deitou outra vez e o beijou.
- Casa comigo? – Gabriel a encarou sério.
- O que? – Mad se assustou e sentou outra vez.
- Casa comigo – ele repetiu – Eu venho morar aqui se você quiser, mas casa comigo.
- Gabriel, você enlouqueceu? – Mad riu, mas ele continuava sério – Ontem mesmo estava falando do seu trabalho no Brasil, como vai se mudar pra cá?
- Eu dou um jeito – ele sentou também e a encarou – Mas eu te amo e não vou deixar que vá embora outra vez. Você é a única pessoa com quem quero me casar.
- Não é tão simples assim – Mad se sentia tonta, era muita coisa acontecendo ao mesmo tempo – Você me pegou despreparada!
- Mas também não é tão complicado assim – ele segurou seu rosto e ela não conseguiu segurar algumas lágrimas – Se está pensando no Evan, não tem problema. Eu assumo ele como meu filho! Faço o que você quiser.
- Gabriel, eu... eu... – mas ela não conseguia terminar de falar.
- Você não precisa responder agora – ele a beijou devagar e ela parou de chorar – Leve o tempo que precisar, mas saiba que dessa vez não vou deixar você escapar – ela riu – Eu te amo.
- Também te amo – ela respondeu o beijando.
Ele a puxou para um abraço e sorriu. Ela era a mulher da sua vida e não ia cometer o mesmo erro duas vezes.
ººº
Desde que as Olimpíadas haviam começado a maratona de jogos era intensa, mas não só para os atletas. Gabriel levantava todos os dias antes das 6h da manha, separava todas as fotos que havia feito no dia anterior, preparava seu material para mais um dia de trabalho e acordava a irmã e os gêmeos Menken às 8h, para tomarem café e encararem as arenas olímpicas. Ao contrario do que pensou, Clara não reclamava de ter que levantar cedo e pulava da cama com disposição, o acompanhando durante todo o dia sem atrapalhar. Claro que, junto com Keiko e Hiro, às vezes se animavam demais, mas nada que Gabriel não conseguisse manter o controle. A agitação dos bastidores conseguia manter os três ocupados, sem saber para que lado olhar ao reconhecer os atletas que passavam próximos a eles. E ele também contava com a ajuda de Monique, prima dos gêmeos, que não perdia o trio de vista um minuto sequer.
Embora o trabalho não lhe reservasse tempo para descansar e se distrair, por varias vezes Gabriel se pegava pensando no que aconteceu em Paris alguns dias antes. Quando comprou as passagens como presente de aniversário para a irmã, jamais imaginou que fosse reencontrar Madeline e acabar lhe pedindo em casamento. Ela ainda não havia dito que sim, mas também não recusou, e ele entendia seus motivos para não responder de imediato, embora afirmasse que também ainda o amava. Madeline agora tinha um filho de 2 anos que era prioridade em sua vida, ela precisava pensar no que isso poderia afetar Evan. Mas embora entendesse o tempo que ela precisava para pensar, não podia evitar ficar aflito. Já estavam em Londres há quase uma semana e não tivera mais noticias dela.
Sua agenda hoje estava reservada para a cobertura das competições de Ginástica Artística, que se estenderiam durante todo o dia. Clara estava animada. Ela não admitia, mas era seu esporte favorito. Gabriel deixou os três acomodados no banco próximo à concentração das ginastas sob responsabilidade de Monique e começou a montar seu equipamento para fazer as fotos quando uma voz conhecida chamou sua atenção.
- Melhor modalidade para se cobrir, não acha? – Dominique falou admirando as ginastas se aquecendo.
- Por que não me ocorreu que encontraria você aqui? – Gabriel sorriu e foi cumprimenta-lo – Mas juízo, são todas menores de idade.
- A lei não me proíbe de admirar, apenas de me aproximar. E aquela ali? Não é menor – e indicou Monique com a cabeça.
- Não muda nunca, não é? – Gabriel riu – Onde está sua miniatura? Ficou em Paris?
- Não, trouxe comigo. Austin! – Dominique olhou para trás e chamou o filho.
Um menino de 6 anos de cabelos pretos cacheados e olhos escuros levantou a cabeça e foi caminhando até o pai. Ele tinha um par de óculos escuros na cabeça e usava uma camisa com os dizeres “I’m a very good bad example”. Era uma cópia fiel do pai, em todos os sentidos. Até no jeito de caminhar ele lembrava Dominique, sempre atento a quem estava a sua volta, principalmente se eram as ginastas prestes a competir, se alongando pelo tatame.
- Austin, lembra do Gabriel? – o menino fez que sim com a cabeça e estendeu a mão a Gabriel – Clara está ali, com mais dois amigos. Fique perto deles, ok? – e ele assentiu com a cabeça, correndo na direção de Clara.
- Ele não nega ser seu filho mesmo – Gabriel comentou rindo, vendo Austin se apresentar a Keiko e Monique – Veio sozinho com ele?
- Por que não pergunta logo se Mad veio? – Dominique foi direto e Gabriel riu um pouco sem graça – Não, ela não veio ainda porque tinha muito trabalho na galeria com Marie. Bernard disse que viriam depois em caravana com as crianças. Talvez cheguem hoje, mas não posso dar certeza que Mad venha nessa primeira leva, elas realmente tinham muito trabalho. Mas relaxa cara, ela gosta de você e duvido que deixe você ir embora outra vez.
Gabriel sorriu um pouco mais aliviado, mesmo já sabendo de tudo aquilo. A voz do locutor da competição começou a ecoar pelo ginásio e a conversa encerrou, enquanto suas câmeras trabalhavam rápido para não perder nenhum movimento dos atletas.
ººº
O dia de eliminatórias na Ginástica Artística teve um saldo positivo para as ginastas que Clara torcia. A equipe brasileira se classificou entre as 5 melhores e ia disputar o lugar mais alto do pódio no dia seguinte, e ela não tinha planos de estar em nenhum outro lugar senão a Arena Olímpica. Gabriel já estava ciente disso, mas por sorte também estava escalado para cobrir as finais, então não precisaria se preocupar em perdê-la de vista.
- Gabriel, tenho que ir andando porque a ferinha quer comer palitos de peixe antes de irmos pro restaurante – Dominique anunciou quando terminou de guardar sua câmera e fazia sinal para o filho se juntar a ele – Prometi antes de sair de Paris, ele está me cobrando incansavelmente.
- Tudo bem, ainda vou passar no hotel para guardar essas coisas antes de ir – ele assentiu – 21h no Rainforest Café?
- Isso. Só lá conseguimos comer e entreter as crianças ao mesmo tempo.
Gabriel riu, lembrando de algumas das crianças que ele sabia que já estavam em Londres e estariam no restaurante naquela noite. Os três filhos de Viera e Manu, os dois filhos de Samuel e a filha mais velha de Ian e seu filho mais novo, que vinham com Marie. Somado aos três que estavam com ele e mais os outros que os encontrariam a noite, o restaurante precisava mesmo de uma estrutura capaz de resistir a um tornado.
- São 20h, vamos sair em meia hora – Gabriel anunciou quando chegou ao quarto do hotel com Clara, Keiko e Hiro – Acham que podem se arrumar a tempo?
Os três assentiram com a cabeça e correram para o quarto conjugado onde dormiam, começando a revirar as malas atrás de roupas limpas e cronometrando o tempo que cada um gastava no banho. Gabriel terminou de se arrumar bem antes das crianças e usou o tempo livre para se certificar de que Miyako já estava mesmo na cidade com Tiago e Eicca e que Ty não havia se atrasado e conseguira chegar com Rory, sua barriga de 5 meses de gravidez e as quatro crianças. O jantar era um reencontro da turma de Beauxbatons, mesmo que ainda não fosse estar completa. A parte de que hoje talvez não estivesse completa não lhe escapou. Estaria desfalcada justamente se Madeline tivesse ficado em Paris. Por mais que tentasse ter paciência, não conseguia evitar que isso lhe incomodasse. Isso talvez significasse que ela já havia tomado uma decisão e essa seria permanecer em Paris, com as coisas do jeito que estão.
- Elas ainda não estão prontas? – Gabriel perguntou ao perceber que Hiro já estava arrumado e jogava videogame em seu lado do quarto. Ele negou com a cabeça, sem desviar os olhos da tela – Clara, Keiko, vamos logo com isso! Mais 10 minutos!
Alguém bateu na porta do quarto, mas o barulho não desconcentrou Hiro do jogo na tela da TV. Gabriel estranhou, não tinha marcado com ninguém no hotel nem pedido serviço e Hiro negou, ainda sem piscar, que algum deles também tivesse pedido. Talvez Miyako tenha chegado cedo e resolveu passar no hotel para irem juntos, pensou. Poderia ter imaginado qualquer pessoa para estar batendo a porta do quarto, menos a que encontrou ao abri-la. Madeline estava de pé no corredor, parecendo ansiosa. Ficaram se encarando alguns segundos, sem dizer nada, mas o sorriso dela dizia tudo que ele precisava saber. Gabriel estendeu a mão e ela a segurou, permitindo que ele a puxasse para junto de seu corpo e a prendesse durante um beijo longo e apaixonado.
- Como subiu sem que avisassem? – perguntou depois que se separaram, mas ainda sem se soltar do abraço.
- Miyako está lá embaixo e me deu uma forcinha – ela riu – O filho dela é lindo.
- Meu afilhado é lindo mesmo – Gabriel sorriu – Todos eles são, na verdade.
Ele a soltou do abraço e segurou sua mão, a puxando para dentro do quarto. Hiro havia desviado a atenção do jogo e chamado a irmã e a amiga para presenciar o ocorrido. Keiko e Hiro olhavam confusos, mas Clara tinha um sorriso discreto desenhado nos lábios que ia do deboche a alegria muito rápido.
- Keiko, Hiro, essa é Madeline – Gabriel olhou para ela para se certificar de que era seguro continuar. Seu sorriso dizia claramente que sim – Minha noiva. Keiko é minha afilhada e Hiro é afilhado do Ty, eles são-
- Irmãos da Miyako – ela completou por ele – Por mais que isso seja impossível, são a cara dela.
- Espera ai, como assim “sua noiva”? – Keiko falou surpresa e Hiro concordou com a cabeça – Você nem tava namorando até 10 minutos atrás! Ou tava?
Clara começou a rir e Gabriel e Madeline acabaram rindo também. Os gêmeos continuaram com expressões confusas, mas Gabriel sentou na beira da cama com ela, sem soltar sua mão, e explicou pacientemente. Ainda haviam pontos a serem acertados e decisões a serem tomadas, mas agora era oficial e nenhum dos dois ia voltar atrás. Ele finalmente se casaria com a mulher da sua vida.