‘O que você está fazendo aqui?’
‘Você precisa me escutar. Eu posso explicar tudo’
‘Eu vi. Não precisa dizer mais nada. Vai embora daqui! É o meu local de trabalho e eu tenho uma aula para dar agora’
‘Eu não vou sair daqui enquanto você não ouvir o que tenho para dizer. Se precisar, vou dormir neste banco. E se você continuar evitando, eu faço um escândalo na frente dos seus alunos!’
Henri encarou Sophie nervoso, mas ela parecia decidida. Ouviu um estalo no campo de quadribol e deu uma espiada pela porta. Os jogadores do time da Nox, que estavam hospedados em Durmstrang, haviam chegado para o treino.
‘Ok. Podemos conversar depois da minha aula então. Fique aqui na minha sala e quando eles forem embora, resolvemos de uma vez por todas esse assunto. Não saia daqui’ ele repetiu enfático e ela concordou com a cabeça.
O treino correu bem. Apesar de termos só 60 minutos por semana, treinar no castelo de Beauxbatons parecia renovar nossos ânimos aos termos de voltar para a geleira. Quando o professor Henri apitou e sinalizou para que descêssemos, as sete vassouras se inclinaram para o chão.
- Muito bem, time. Vocês foram ótimos! Simone, Edith, parabéns pela sintonia. A dupla de batedores tem que jogar sempre junta, e vocês parecem sincronizadas! Excelente! Augustin, Jean e Eugene, vocês também estão muito bem. Mas aconselho cobrirem todo o campo de quadribol, mesmo quando um de vocês estiver com a posse da goles avançando contra o gol adversário. É importante que pelo menos um de vocês fique na retaguarda para um possível contra-ataque. Charles, cuidado com seu aro da esquerda. Ele ficou muito tempo sozinho enquanto você pendia para o da direita. E Miyako... – ele tirou os olhos da prancheta de anotações, me encarando impressionado – Perfeita captura! Você demorou um pouco para achar o pomo, ele passou perto mais de uma vez, mas quando o visualizou, foi certeira. Seus reflexos para fugir dos balaços também estão bons... Então, acho que não tenho mais nada a acrescentar. O próximo jogo de vocês é na semana logo após as férias de Natal, contra a Lufa-lufa de Hogwarts. Teremos um treino antes, não se preocupem. Ainda não entramos na fase eliminiatória, mas é importante ganharem para fecharem como líderes de sua chave. Se jogarem como hoje, vão ganhar, com certeza! – ele completou animado e os meninos se agitaram. - Alguma pergunta? – como ninguém disse nada, ele sorriu. – Estão dispensados, então. Nos vemos em janeiro.
Simone, Edith, Eugene e Jean se despediram de nós e saíram juntos do campo, de volta para Beauxbatons. Eu, Augustin e Charles tínhamos de esperar mais dez minutos, até nossa chave de portal nos levar diretamente a Durmstrang. Henri terminava de guardar as bolas na caixa e fui ajudá-lo a prender um balaço revoltoso.
- Obrigado. – ele respondeu ofegante quando finalmente conseguimos acorrentá-lo. Sorri sacudindo os ombros. – Então... boas férias. – ele disse sorrindo abertamente. Seus olhos, de um intenso verde, brilharam. Me senti corar. Queria responder alguma coisa descontraída (como sempre), mas não saiu nada além de um aceno com a cabeça e um projeto de sorriso. Ele pegou a caixa e já ameaçava ir para sua sala.
- Você não vai ao Baile amanhã...professor? – Perguntei antes que pudesse segurar.
- Não sei. Fui convidado, mas ainda tenho uns negócios para resolver. Se der, vou.
Nos encaramos mais uns segundos e concordei com a cabeça. Ele se virou e sumiu atrás da porta, alguns segundos depois. Conformada, fui me sentar com os meninos, que comentavam sobre as partidas do torneio e dos diversos jogadores das escolas. Não estava prestando atenção. Ainda faltavam oito minutos, até que nossa chave saísse...
- Olhem! O professor deixou o apito cair. – Charles disse de repente, apontando um apito dourado na grama e se levantando para apanhá-lo. – Ainda temos tempo? Vou lá devolver...
- Deixa que faço isso. Não estava prestando atenção na conversa mesmo. – tomei o apito de sua mão, me levantando de um pulo. Ele me olhou um tanto desconfiado, mas já sai caminhando em direção à sala do professor, no fim do campo.
Já estava com a mão estendida para girar a maçaneta quando ouvi uma voz feminina dentro da sala. Do ponto onde estava não dava para ver Augustin e Charles, então, silenciosamente, me encostei contra a porta para tentar escutar mais alguma coisa.
‘Foi um erro. Ele me beijou e eu me deixei levar. Mas não temos mais nada em comum, só o passado. Acredite em mim. Eu gosto de você!’ a mulher parecia um tanto desesperada quando falou.
‘Desculpe, Sophie. Eu não confio mais em você. Da última vez, também foi assim. Você já me decepcionou o suficiente’ a voz de Henri respondeu, parecendo vacilante.
‘Você não pode terminar tudo comigo. Nós íamos nos casar!’
‘Por isso mesmo. Vamos terminar essa farsa agora, antes que cometamos esse erro. Você não me ama de verdade, e o meu amor por você acabou depois de tantas traições. Vamos terminar por aqui, antes que acabemos por inimigos’ eles ficaram em silêncio alguns segundos e quando Henri recomeçou a falar, parecia decidido ‘Vai embora, por favor? E não volte a me procurar. Muito menos nos meus locais de trabalho...’
‘Não faz isso. Eu...eu te amo. Nunca mais vai acontecer, eu prometo’
‘Sophie, por favor?! Me solta. Sophie...’
Consultei o relógio. Em menos de dois minutos a chave de portal seria ativada. Sem bater, abri a porta de uma vez. Henri tentava se soltar das mãos de uma jovem (que aparentava ter a mesma idade que ele), bem bonita. Os cabelos longos e loiros lhe caíam sobre os ombros, e os olhos azuis estavam avermelhados e molhados de lágrimas. Assustados com minha chegada, Sophie saltou pra trás se virando de costas para mim e Henri parecia pálido.
- Desculpe, professor, mas... você esqueceu seu apito no campo. Vim devolver.
- Miyako, eu...nós...você está aí há muito tempo? O que? Obrigado. – ele ia dizendo aturdido e apanhou o apito de minha mão, se me encarar.
- Tenho que ir. A chave de portal vai sair em 40 segundos...- disse apressada.
- Não, espere, eu...
- Tudo bem, professor. Tenho mesmo que ir! Tchau.
Sem mais uma palavra, corri desabalada de volta ao gramado, onde Augustin e Charles já seguravam uma garrafa vazia e gritavam para me apressar. Quando toquei o dedo na garrafa, senti um puxão de gancho no umbigo e o campo de quadribol sumiu de vista, dando lugar a uma profusão de cores e formas distintas. Não saberia dizer se era o efeito da chave de portal, ou meus pensamentos, mas quando chegamos a Durmstrang, estava tonta.
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O Baile de Inverno já estava correndo há algumas horas. A decoração estava linda e o show das Esquisitonas fazia encher de alunos a pista de dança. Senti meus pés arderem e deixei um pouco a confusão, para descansar na mesa, porém, mal tinha me sentado e Ricard passou como um foguete por mim, agarrando meu braço com força e me arrastando para os jardins. Quando finalmente paramos de correr, ele olhou para os dois lados, tenso, e me encarou ansioso, em seguida.
- Você...precisa...me...ajudar. – ele disse soando desesperado.
- Espero que tenha um bom motivo para ter arrancado quase metade do meu braço. – respondi com rispidez puxando meu braço de suas mãos e massageando. – O que aconteceu?
- Inês! Ela está me perseguindo! Ficou uma hora me enchendo o saco por causa da minha gravata, “que está horrorosa e torta”! Aproveitei que ela foi ao banheiro e fugi, mas ela vai me achar daqui a pouco... Sério, me ajuda a me livrar dela?! Eu estou enlouquecendo! – ri debochada e abri a boca para dizer um “eu te avisei”, mas ele me cortou antes, impaciente. – Já sei, você me avisou. Você e metade de Durmstrang. Eu que sou um burro mesmo... Vai me ajudar ou não?
- Ajudar você como, pode dizer? Quer que eu fale pra ela que está de saco cheio? Quer que eu bata nela?
- Me beija! – ele disse rápido me puxando pra mais perto.
- O quê???
- Agora. Ela está saindo. – estávamos muito próximos e os olhos dele me imploravam. Olhei pra trás, Inês vinha saindo do castelo, procurando Ricard.
- Você me deve essa, escutou? – foi a única coisa que disse antes de puxá-lo pelo pescoço e dar-lhe um beijo longo.
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- Eu nunca vou poder te agradecer o suficiente, Mi. – ele disse aliviado, afrouxando a gravata. Ri.
- Daqui pra frente, só garotas “normais”. Combinado?
- Feito. – ele sorriu. – Bom, agora vou para a Spartacus. Toda essa fuga me deu sono... Se você já quiser voltar para a Avalon, te acompanho.
- Não, vou ficar aqui mais um tempo. Boa noite.
- Boa noite. – ele me deu um beijo no rosto, agradecido, e foi sozinho em direção às Repúblicas.
Pensei em voltar para o Salão Principal e aproveitar o restante do show mas, quando virei as costas, meu coração deu um solavanco. Parado atrás de mim, parecendo apreensivo, estava o professor Henri.
- Podemos conversar, Miyako? – ele perguntou sem rodeios e concordei com a cabeça. Caminhamos em silêncio até o lago. – Sobre ontem...
- Não precisa se explicar. Eu garanto que por mim, ninguém vai ficar sabendo do que aconteceu. – disse séria o encarando e ele pareceu se relaxar um pouco.
- Obrigado. Mas mesmo assim, eu acho que ainda te devo explicações... Aquela é Sophie, minha ex-noiva. Ela não aceita o fim do relacionamento e foi a Beauxbatons ontem, pedindo que eu reconsiderasse. Eu posso garantir que não vai acontecer novamente. – ele frisou cada palavra.
- Professor... é sério. Eu já até esqueci o que aconteceu.
- Henri. – ele disse enérgico. – Me chame de Henri, pelo menos quando eu não estiver te dando aulas... Ou Tiago, se preferir.
- Tiago? – perguntei esquecendo todo o assunto anterior e me divertindo internamente.
- É o meu primeiro nome. Só me conhecem como Henri, por causa do time... Parecia mais “francês”, entende? Por que está rindo? – ele perguntou sorrindo também, curioso.
- Nada... é só que... parece que eu já li essa história uma vez. – comentei mais para mim mesma e ele pareceu ainda mais confuso. Ao longe, vi Inês saindo de mãos dadas com Derek, parecendo se divertir. Balancei a cabeça, rindo. – Esquece, ok? Estou pensando alto. Quanto à Sophie e à conversa, esquece isso também. Quero dizer, espero que vocês tenham se acertado e...
- Não. Acabou. Tudo o que mais quero é apagar tudo o que aconteceu. Só que fiquei preocupado, afinal, aquele é o meu local de trabalho. Não queria que você pensasse que estava confundindo as coisas.
- Não pensei nada disso, não precisa se preocupar. – apressei em dizer, me sentindo tão leve que poderia voar. - Se para nós dois esse assunto está morto, então vamos enterrá-lo e conversarmos sobre outras coisas. – sugeri depressa e ele concordou, animando-se.
- Gelado aqui, não é? – comentou e rimos, nos acomodando em um banco.
Aos poucos, eu me sentia mais à vontade e ficamos conversando na beira do lago até uma multidão de estudantes sair do castelo comentando animadamente sobre o Baile de Inverno. Baile este, que eu nunca mais me esqueceria...
With each word your tenderness grows
Tearing my fear apart
And that laugh, wrinkles your nose
Touches my foolish heart
Lovely!
Never ever change
Keep that breathless charm
Won’t you please arrange it, cause I love you
Just the way you look tonight
Frank Sinatra – The way you look tonight